sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Folha de S.Paulo: A lógica na compra de uma startup por US$ 19 bilhões




Quando uma empresa iniciante promissora é vendida por US$ 19 bilhões, fica claro que algo importante mudou no mundo. Mas antes de correr para se unir ao coro de "bolha!", vale a pena considerar se há algo mais acontecendo.

O montante que o Facebook está pagando pelo WhatsApp (que inclui um máximo adicional de US$ 3 bilhões em futuros pagamentos a engenheiros que optem por não se aposentar imediatamente em uma praia do Havaí) é mais de 10 vezes superior ao que o Google pagou pelo YouTube e também mais de 20 vezes maior que o valor pago pelo Facebook para adquirir o Instagram.

Uma mensagem é que os vendedores de companhias como essas estão mais espertos quanto ao que há em jogo.

Em um mercado em que todos os espólios cabem ao vencedor, as plataformas digitais que saem por cima tendem a ficar com parcela desproporcional da atividade dos usuários.

O US$ 1,65 bilhão que o Google pagou pelo YouTube ou o US$ 1,5 bilhão que o eBay desembolsou pelo PayPal pareciam preços muito elevados, quando essas transações ocorreram.

Mas as duas companhias vieram a dominar os segmentos de vídeo online e de pagamentos online - atividades essenciais na Internet. Em retrospecto, os vendedores dessas empresas abriram mão de duas das mais valiosas propriedades da internet a preço de banana.

RENDIMENTO ESPANTOSO

A Sequoia Capital, companhia de capital para empreendimentos que investiu nas duas então startups, também é a única investidora no WhatsApp.

Seu retorno de entre US$ 2,5 bilhões e US$ 3 bilhões com essa transação, por um investimento de quase US$ 60 milhões, sugere que a companhia aprendeu a lição.

A escala de atividade que as plataformas digitais vencedoras geram pode ser espantosa. O WhatsApp alega operar número de mensagens quase equivalente ao total somado de mensagens de texto de todos os sistemas mundiais de SMS.

É claro que nada disso significa que o serviço se provará tão valioso quanto o YouTube e o PayPal. É especialmente insensato aplicar velhas normas de avaliação a novos comportamentos digitais.

Ao justificar o alto preço que está pagando, o Facebook apontou que as mensagens de texto são um negócio de US$ 100 bilhões anuais - com a óbvia implicação de que uma grande proporção desse dinheiro agora fluirá da companhia de mensagens móveis para os cofres da compradora.

Mas os apps de mensagens para celulares floresceram exatamente porque são em larga medida gratuitos (não está claro que proporção dos 450 milhões de usuários do WhatsApp paga a assinatura anual de 99 centavos de dólar depois dos primeiros 12 meses de uso).

É um traço característico da Internet que grande parte do valor criado por serviços que perturbam o modelo existente flua para os usuários.

MONETIZAR

O Facebook está fazendo uma imensa aposta em que os gênios da monetização que fizeram de seu app móvel uma máquina de faturar executem o mesmo trabalho com o WhatsApp.

Se existe alguma lógica "setorial" na aquisição, ela parece advir disso. Mas o fato nada tem a ver com os US$ 100 bilhões faturados com serviços de mensagens de texto, que agora estão rapidamente evaporando.

A outra coisa que os vendedores de companhias como o WhatsApp aprenderam é que alguns compradores estão ficando desesperados - e eles têm muito dinheiro.

Logo que Mark Zuckerberg foi coroado como novo rei do Vale do Silício, ele se viu enfrentando um daqueles dilemas que as companhias de tecnologia precisam encarar periodicamente: como reorganizar seus negócios para um mercado inteiramente novo, nesse caso o móvel.

FACEBOOK MÓVEL

Existem duas maneiras de encarar sua onda de aquisições no mercado móvel. Se for um fato isolado, com o objetivo de ajudar o Facebook a superar o fosso que existe entre seu passado nos computadores e seu futuro nos aparelhos móveis, o dinheiro provavelmente terá sido bem gasto.

Três quartos do preço de aquisição do WhatsApp serão pagos em ações do Facebook, que hoje valem três vezes mais do que a cotação que tinham na metade do ano passado - e as ações da empresa subiram recentemente devido ao seu sucesso no mercado móvel.

Ao comprar serviços de fotos e mensagens instantâneas, o Facebook agora conta com operações em duas das principais atividades da Internet móvel.

Com o recente lançamento do Paper, um app bem recebido criado para mostrar seu feed de notícias, o Facebook também pode contar com um terceiro app forte em seu elenco, para o futuro.

Controlar um conjunto mais forte de apps não será o suficiente por si só. Entre os problemas do Facebook estará como garantir distribuição em um mundo dominado por plataformas de software móvel controladas por rivais e por operadoras de telefonia móvel que exigirão participação nos proventos. Mas ao menos a companhia terá uma cartada forte.

Se, por outro lado, as perturbações que o Facebook enfrenta refletirem mais que problemas isolados relacionados à transição para o mercado móvel, então o quadro será desfavorável.

Um modelo de negócios baseado na busca continuada de aquisições, enquanto o comportamento dos consumidores muda, parece fadado ao fracasso.

A companhia quase certamente não conseguirá antecipar as tendências novas em tempo, ou contar com dinheiro suficiente para manter o curso.

Fonte: WATERS, RICHARD . "Folha de S.Paulo."A lógica na compra de uma startup por US$ 19 bilhões. N.p., n.d. Web. 21 Feb. 2014. <http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2014/02/1415111-a-logica-na-compra-de-uma-startup-por-us-19-bilhoes.shtml>.

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