RENATA MIRANDA COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM BERLIM
A tarefa pareceu fácil: passar 48 horas em Berlim usando só bitcoins. O desafio, porém, complicou-se com o passar do tempo, tornando ações simples –comprar água ou andar de ônibus– em provas de resistência e paciência.
A cidade alemã é a que tem mais lugares que aceitam a moeda criptografada. O bairro de Kreuzberg é o epicentro do fenômeno, com estabelecimentos que veem no meio de pagamento não apenas um modo de fazer transações, mas também uma chance de lutar contra o "sistema".
No primeiro dia, logo pela manhã fui para a região da Graefestrasse, parte do bairro pioneiro. A primeira experiência foi no Lekkerlaub, bistrô dentro de um albergue no qual é possível não só pagar a comida com bitcoins, mas também a hospedagem.
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Renata Miranda/Folhapress
"Fish and chips" que deveriam ter sido pagos com bitcoin no Devils Kitchen Bar
"Os bitcoins que nos pagam ficam em nossa carteira virtual como uma poupança, porque o poder de valorização da moeda é tremendo", diz Vesna Sk, sócia do lugar. Quando passou a aceitar bitcoins, a cotação era de € 65.
Depois, fui a uma livraria especializada em ficção científica. Foi duro resistir a um Chewbacca de papelão em tamanho "real". O simpático personagem peludo de "Guerra nas Estrelas" poderia ter sido meu por somente 0,07576 bitcoin (R$ 104).
À noite, antes de sair de casa, lembrei de carregar a bateria porque, se acabasse, não poderia usar o dinheiro. Só então fui jantar no Room77, restaurante cujo dono, o alemão Joerg Platzer, é o principal responsável pela disseminação de bitcoins por Berlim.
FÉ NA CRISE
Platzer começou a aceitar bitcoins em 2010, estimulado pelo temor da crise financeira na Europa. "Realmente acredito que o sistema financeiro atual vai entrar em colapso e a única resposta será a moeda criptografada", diz.
Ele firmou parceria com a ferramenta BitPay para que mais restaurantes aceitem bitcoins. "Quando alguém paga por lá, os bitcoins são transformados em euros na hora e são depositados na conta do dono do bar", explica. Nos próximos dois meses, estima, entre 50 e 60 novos estabelecimentos no bairro passarão a aceitar a moeda.
Filipe Rocha/Editoria de Arte/Folhapress
Na hora da conta, um holandês ao meu lado no balcão achou insensato usar bitcoins. "Só pago com a moeda quando desvaloriza, mas agora está em alta", palpitou o consultor em TI Maarten Van Gaal. "Você deveria guardar e, quem sabe, ficar rica."
Acabei o dia no Devil's Kitchen Bar. Quando fui pagar, pânico: o dono do local, que não estava, é o único com acesso ao tablet. Pela primeira vez em dois dias abri a carteira física –e gastei € 15.
Sobrevivi às 48 horas com algumas moedas. Quatro dias após a aventura, descobri o artista Tiziano Boccacini, 19. Deitado na estação, equilibrava uma vassoura no dedo. No cartaz: "Aceito bitcoins".
"Comecei a investir há mais ou menos um ano, fica mais fácil para receber contribuições", diz. Mas alguém, de fato, usa a moeda para ajudá-lo? "Em uma semana, quatro pessoas usaram", afirma. Fui a quinta doadora. "Nesse ritmo, vou ficar rico."
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