quarta-feira, 13 de março de 2013

Folha de S.Paulo: Mundo conectado é inevitável, mas é preciso discutir limites éticos, dizem especialistas

O mundo futuro só fará sentido conectado --entre si e à internet--, e é inevitável que isso aconteça. É também fundamental, porém, que a sociedade discuta como isso vai acontecer, bem como os limites que devem ser seguidos. A avaliação é dos quatro convidados para o debate "Os Rumos da Tecnologia", realizado na última segunda-feira, para marcar os 30 anos do caderno de tecnologia da Folha.

Participaram da conversa Fábio Coelho, diretor-geral do Google no Brasil, Demi Getschko, diretor-presidente do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), Luli Radfahrer, professor de comunicação digital e colunista da Folha, e Silvio Meira, criador do centro de inovação Cesar e professor de engenharia de software.

"No passado, a computação era para você, aí passou a existir com você e, hoje, como já vemos com os projetos do Google, existe em você", disse Silvio Meira. Sobre os limites para essa coexistência, ele disse acreditar não ver barreiras práticas, mas destacou a importância de discutir as questões éticas.

"No curto prazo, podemos achar que os robôs podem acabar com tudo. Que eles vão dirigir por nós. A realidade, porém, não é assim, pois há implicações nisso. Carros que se autodirigem pressupõem que a culpa do atropelamento é de quem?", provocou.

Segundo ele, a nova sociedade pode não chegar ao ponto em que cada um de nós saberá programar, mas que, como usuários, deveremos ser aptos a entender e discutir a "ética da coisa", se a culpa será de quem programou o carro para dirigir ou de quem estava nele no momento do acidente.

"A tecnologia não tem ética nem moral, não resolve nenhum problema específico. A faca que serve para fazer sushi serve para degolar", comparou Meira, reforçando que tecnologia deve ser um meio de resolver problemas, e não a solução deles.

Sobre tal perigo também falou Demi Getschko. "Como computação virou algo 'bico', é muito mais fácil fazer um relógio com chip e eletrônica que um relógio suíço com mecânica. Isso é bom e ruim, porque tudo vai ter tecnologia embarcada, todos os nossos dispositivos estarão conectados e saberão nossa agenda, por exemplo. Mas isso pressupõe cuidados. Teremos que passar a nos preocupar com o controle que haverá sobre nossa vida diária."

Como exemplo, Getschko destacou que, atualmente, tudo pode ser monitorado com câmera. O lado bom é coibir assaltos, o ruim é que todos podem saber aonde você foi. "Temos que batalhar para que a parte boa seja preservada, deliberada, que os limites sejam debatidos, cuidando para que não sejamos controlados pelo que criarmos", afirmou.

A opinião é compartilhada por Luli Radfahrer. "Internet é uma liberdade política, democrática, um exemplo sem precedentes. E não podemos abrir mão dela. Conseguimos tal conquista sem guerra, sem dor e sem sangue. Não podemos deixar que a parte ruim ou preocupante que ela carrega invalidar a boa."

Para Fábio Coelho, "a grande transformação [para os próximos anos] é que hoje temos um grupo de poucas pessoas pensando em tecnologia. Vamos quebrar paredes ao, no futuro, incluirmos todo mundo no processo".

De acordo com Coelho, em 30 anos o mundo estará ainda mais preocupado com questões existenciais. "A TV sem tela, o carro que se autodirige, os óculos que enxergam sozinhos. Isso é presente, já está em laboratório. A grande revolução será a humana, com tecnologia, poderemos nos agrupar para resolvermos os problemas graves e existenciais da humanidade, da fome, do acesso ao básico."

"Com pessoas conectadas, com essa capacidade de criar conjuntamente, criaremos e resolveremos problemas de forma diferente, mas ainda não sei como será. Teremos um salto de invenção impressionante."

Nesse contexto, segundo ele, o próprio conceito de país é "furado". "Sinto-me mais próximo de alguém que mora na China e pensa como eu, partilha dos meus valores, do que alguém fisicamente ao meu lado. Com a tecnologia, posso me agrupar com alguém do outro lado do mundo [em prol de algo]", disse.

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